Ia até o SESC. Caminhando. Era sábado de sol, mas as árvores desenhavam uma agradável sombra. O amigo com quem eu iria me encontrar furou. Normalmente isso me irrita, ele sempre fura, mas o dia estava bonito e eu relaxei.Gostei tanto da caminhada que me atrasei também para o show que pretendia ver. No caminho, os varais pendurados de Héctor Zamora me chamaram para o museu do Centro Universitário Maria Antonia da USP. Entrei. Vi, me encantei , fotografei e fui descobrir as outras exposições. Um segurança me acompanhou, precisava ter certeza de que eu não fotografaria as outras obras. Vi a 2ª, a 3ª, na última exposição decidi conversar com ele, minha única companhia no museu. O Sr. Segurança havia me perguntado se eu era artista ou professora. Disse que não, que era apenas uma pessoa. Ele riu. Perguntei se ele gostava de arte. Ele disse que sim, mas que não entendia disso, precisava que alguém lhe explicasse o que via. Eu disse que também não entendia, que via tudo, lia (as vezes) as explicações nas paredes e decidia, como uma criança espontânea, se gostava ou não. Ele me perguntou se eu tinha ido à Bienal. Disse que sim, mas só no 1º andar. Ele me perguntou se eu conhecia o Bispo do Rosário (exposto em um dos andares superiores da Bienal). Eu disse que um pouco. Me perguntou se eu sabia sua história. Disse que só sabia que viveu a vida em um manicômio fazendo sua arte. E ele então me perguntou quase saltitante: “Você quer que eu te conte tudo sobre ele? Tem um tempinho pra ouvir?”. Eu surpresa:”Claro que sim!!” E assim, um sábado de sol, um amigo furão e os varais pendurados de Zamora me levaram a uma das melhores aulas de arte que já tive, e o Sr. Segurança virou Sr. Erasmo, que com os olhinhos brilhantes e passinhos em círculo me passou de forma simples, bonita e empolgante o que um dia outro alguém lhe explicou. Que me fez ver tudo o que eu ainda não tinha visto de Bispo do Rosário. E agora eu, como uma ovelhinha do rebanho de contadores de histórias, me sinto sedenta para passar isso adiante, para apenas umas pessoas, espero de forma tão simples, bonita e empolgante como o Sr. Segurança, que se tornou Sr. Erasmo, me contou um dia.
Quando vim à Berlin pela primeira vez fui direto ao museu Judaico. Ele estava fechando, mas senti a necessidade urgente de voltar no dia seguinte. Voltei e me impressionei. Uma arquitetura que faz com que você se sinta, como eu nunca pude imaginar, no holocausto, no exilio e repleto de incertezas a respeito da continuidade das nossas vidas. Final de semana passado voltei mais uma vez. Senti tudo de novo, no holocausto, exilada e incerta a respeito da vida. Decidi que iria além e andaria sobre a brilhante e terrível obra de Menashe Kadishman. Shalekhet (Folhas caidas) preenche com 10,000 faces de metal um dos vazios deixados por Daniel Libeskind em memória dos mortos durante o holocausto. Ao caminhar sobre as faces fazemos com que elas ganhem voz. Mas as vozes gritam, choram e ecoam no vazio e nos fazem sentir a cada passo a dor e o drama de cada folha caída. Brilhante e terrivel. Impressionante sentir como arquitetura e arte são capazes de nos posicionar em um mundo que não conhecemos, nos fazendo refletir ao ‘calçar o sapato do outro’.
When I visited Berlin for the first time I went straight to the Jewish Museum. It was closing but I felt the urgent need to return the next day. I went back and was impressed. The architecture made me feel as I counld never imagine, in the Holocaust, in the exile and full of uncertains about the continuity of my life. Last weekend I returned once more. I felt everything again. In the Holocaust, exile and the uncertanties. I decided I would go further and step upon the brilhant and terrible installation by Menashe Kadishman. Shalekhet (Fallen Leaves) occupy with 10,000 metal faces one of the voides left by Daniel Libeskind in memory of the dead during the Holocaust. When walking on the faces they gained voice. But the voices were screaming, crying and echo in the emptiness and made me feel at every step the pain and drama of each fallen leave. Brilhant and terrible. Impressive to feel how architecture and art are able to position us in a world we do not know, making us reflect by ‘wearing the shoes of others’.
Um dos passeios que mais gosto é visitar locais históricos que passaram por alguma intervenção contemporânea. Foi uma grata surpresa nossa visita ao Mosteiro de Santa Clara – a velha, em Coimbra. Entramos sem planejar e o que encontramos foi um projeto de recuperação e arqueologia lindíssimo.
A história deste local tem início em 1314, situado às margens do rio Mondego o Mosteiro sofreu inúmeras enchentes ao longo dos séculos e em 1677 foi transferido para um novo local mais elevado e distante do rio. A partir desse momento o Mosteiro passou alagado e abandonado até 1995 quando o processo de recuperação teve início com o rebaixamento do lençol freático através do bombeamento constante da água.
Hoje, com projeto de Alexandre Alves Costa, Luis Urbano e Sérgio Fernandez o Mosteiro conta com um prédio novo (foto 1) paralelo à igreja antiga onde ficam situados a entrada, a área expositiva, banheiros, café e administração. Os acessos são feitos por rampas de concreto e passarelas de deck de madeira elevadas do solo que conduzem o visitante por um circuito à ser seguido (foto 2).
Dentro da igreja foi instalado um piso elevado de aço cortem (foto 3) que proporciona a colocação de rampas de acesso e equipamentos de iluminação sem nunca interferir na construção original.
No pátio escavado ao lado da igreja estão as instalações do antigo clausto e pátios. (foto 4)
A primeira vez que me lembro de ser tocado por um museu foi quando visitei o Masp e sequer consigo precisar se essa foi a primeira vez que o visitei. Mas naquela tarde (acho que tarde) mais do que ver ou gostar das obras expostas, lembro de ter amado aquele lugar, aquela arte flutuando em vidros, aquele salão imenso, aquela Paulista vista lá de cima do seu último andar daquele prédio que insiste em me apaixonar. E desde então eu amo ir a museus. A todos eles, dos pequenos, aos gigantescos.
E é com essa tinta vermelho sangue de muito amor por museus que falarei sobre o Museu Fundação Iberê Camargo, de Porto Alegre, projeto do arquiteto português Álvaro Siza.
Amo com aquele amor Almodoviano aquele prédio porque ele, por si só me paralisa. Porque ele parece um polvo explosivo que me consome, me pega e me muda. Amo aquelas aberturas que emolduram a cidade que está a sua volta transformando-a com a mesma sutileza que o Masp me mudou naquele dia, ou naquela tarde, nunca vou saber. Siza, com a precisão de um construtor de (belos) lugares faz com que as pessoas que andam em seus corredores brancos e solitários virem mais do que sombras perambulantes atrás de um pouco de cultura, calma e paz. Até porque arte é muito mais do que cultura, calma e paz e aquele prédio me faz olhar para o tempo em si, o tempo que avança ligeiro ao mesmo tempo que consegue congelar o momento que ele foi gerado e pensado, mantendo a chama do fazer viva. Como a arte e como a arquitetura devem ser.