dance para mim

quando eu mais quiser, quando você menos precisar. Dance para mim daquele jeito belo e desesperado, com toda a pressa e vontade eterna do segundo mais rápido do mundo. E eu ficarei anos depois para reconstruir esse instante. Anos reconstruindo em minha mente quase doentia os movimentos bobos e aleatórios que você fez, sem querer querendo, para mim, só para mim.

Dance porque é assim que nos conhecemos e é assim que você fica mais perto do meu mundo. Porque, ao contrário do que todo mundo sempre pensa, felicidade não é viver uma grande paixão mas ter alguém que te faça sorrir com passos desengonçados e quase nenhum ritmo.

Porque só na dança eu, primeira pessoa do singular, vejo você, primeira pessoa que penso quando estou feliz. Só nela e com ela eu consigo, mesmo somente olhando, participar de um momento íntimo e intransferível. Porque eu-chão, seu-chão, não tenho como não amar seus pés firmes encima de mim. Somos a equação fácil do amor do solo com a árvore, do ritmo com a vontade de se mexer, do óbvio feijão com o arroz e da deliciosa piscadinha com o sorriso mais terno e doce que existe.

Dance olhando para baixo, fechando os olhos de leve, mexendo os braços fazendo-os desenhar o ar. Dance trocando os pés de lugar, rabiscando o mundo num mapa imaginário onde só tem sentido se você e eu, vez ou outra, nos esbarrarmos por ai. Dance aquela música indie estranha, que todo mundo só vai se acostumar com sua sonoridade daqui a um ano ou mais, porque você tem o movimento como tema e usa com isso o compasso da leveza quando quer me conquistar.

E quando eu ficar doente, dance ao pé da minha cama. E quando o mundo gritar com você, responda com o mais suave e decidido gesto de braços e pernas e cabeça e ombros e barriga e pescoço e dedos e pele e pelos. Porque é disso que o mundo precisa e é isso que eu espero de você.

E dance para mim quando acabar o nosso amor,

dance para mim para passar a minha dor,

dance sem precisar ser feliz,

sem motivo, dance, apenas dance.

 

E se eu fosse Nora Ephron faria um filme sobre você dançando. Mas não sou. Fico assim com o pedido cabal e fatal, pela última vez: dance para mim. Só para mim.

nota: fui assistir ao filme da Madonna, W.E., que não é da Nora Ephron, mas isso pouco importa. Sai de lá só pensando em dançar. E é assim que vai ser.

 

texto piblicado no malvadezas

Postado por: Antonio



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